LITERATURA: LIVRO REVELA BASTIDORES DA CENSURA NOS TEMPOS DA DITADURA
Os autores de Mordaça: Histórias de Música e Censura em Tempos Autoritários”, João Pimentel e Zé McGill, pretendiam lançar o livro em 2018, quando o Ato Institucional no. 5 (AI-5) completou 50 anos.
Mas não conseguiram e o livro só foi lançado no final do ano de 2021. Com um ritmo ágil e documental, os autores contam a história da censura às músicas e artes brasileiras durante os anos da ditadura militar.
São no total 29 capítulos, abrangendo histórias de músicas de Caetano Veloso, Chico Buarque, Odair José, Gilberto Gil, Beth Carvalho, Joyce, Jorge Mautner, Marcos Valle, Léo Jaime, entre outros.
O tema – censura nos anos de chumbo – não é novo, mas não havia ainda sido narrado pelos próprios personagens censurados. São histórias sobre os rigores da ditadura, prisões arbitrárias e, principalmente, músicas censuradas sem que os censores sequer soubessem porque estariam censurando.
Os autores descrevem os censores como pessoas bem intencionadas, dispostas a fazer bem o seu trabalho de mutilar as obras dos outros. Mas também descrevem a absoluta falta de critérios para os cortes nas músicas e o despreparo de alguns – até mesmo ex-jogadores de futebol e ex-padres eram convocados para censurar obras artísticas –e o faziam sem dó.
FALTA DE CRITÉRIOS E DE CONHECIMENTO
Caetano Veloso narra a história de um censor que queria suspender o seu show, porque havia se deparado com a música “Nine out of tem”, cujo primeiro verso, em inglês, dizia “I walk down Portobello Road to the sound of reggae” (“Eu desço a Portobello Road ao som do reggae”).
Os censores não haviam encontrado o significado de “reggae” e, por causa da palavra, queriam suspender o show todo. Caetano lhes explicou que era um ritmo jamaicano novo e que a palavra ainda não estava em dicionários. O ex-padre aceitou as explicações e liberou o show, com a ameaça de que, se o compositor estivesse mentindo, seria preso e o show suspenso.
O livro conta que Ney Matogrosso era hippie – afinal, tinha cabelos compridos, confeccionava e vendia peças de artesanato em couro pelas ruas. A aversão dos militares aos hippies era grande – e por isso Ney era revistado a todo momento. Numa noite, ao chegar num teatro, perguntou a dois homens se o show ainda estava rolando. Não eram civis; eram policiais disfarçados, que o revistaram, prenderam-no por vadiagem e só o liberaram quando Ney afirmou que seu pai era militar.
As histórias são saborosas e dão um panorama do que era viver naqueles tempos. Além de refrescar a memória daqueles que os viveram, também serve de alerta para os que vivem clamando pela volta da ditadura militar.
Vale a pena.
Serviço
Livro: MORDAÇA – HISTÓRIAS DE MÚSICA E CENSURA EM TEMPOS AUTORITÁRIOS
Autores: João Pimentel e Zé McGill
Editora Sonora
336 páginas
Preço: R$ 69,90, Amazon
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