Começou, como sempre, o jogo de “empurra-empurra”, sem se definir regras específicas para o enfrentamento real de crises semelhantes, que poderão aumentar de ora em diante, pelas mudanças climáticas.
No apagão que começou na sexta-feira, 11 de outubro, com tempestade forte que atingiu, além da capital, vários municípios da região metropolitana, nada foi feito de real – a não ser as acusações e o jogo de empurra-empurra de sempre.
Solução que é bom, nada.
Hoje é o terceiro dia sem energia elétrica e ainda faltam, de acordo com dados atualizados da imprensa paulista, cerca de 700 mil residências para serem regularizadas, isto é, para voltarem a ter energia elétrica.
Cotia é uma das cidades que foi muito prejudicada com a tempestade, sendo que praticamente toda a cidade ficou sem energia elétrica. Apenas alguns pontos privilegiados permaneceram com as luzes acesas e geladeiras funcionando.
No restante, incômodos diversos: baterias de celular se esgotando sem ter onde recarregar, falta de internet para quem tinha bateria, geladeiras e refrigeradores degelando, alimentos perdendo… e o pior, sem ter a quem recorrer.
De acordo com comunicado do prefeito de Cotia, equipes da Defesa Civil e Secretaria de Obras estavam todas nas ruas, minimizando os estragos. Mas, verdade seja dita: a Defesa Civil só pode socorrer os eventualmente desabrigados e cortar árvores que impedem as ruas.
Porque a ligação de energia depende da Enel, e esta, a partir de determinado momento de sábado, deixou de atender ligações. Ou melhor, atendia e ora falava que o cadastro do consumidor estava irregular, caso deste jornalista (não está), ora a vozinha eletrônica afirmava que iria passar para o departamento competente – e a ligação, convenientemente, caía.
RELIGAÇÃO: DEVAGAR COMO SEMPRE
No nosso caso, lá pelas 3 da manhã de sábado para domingo (mais de 24 horas sem energia), entrou um veículo da Enel no bolsão, deu uma volta e o motorista afirmou ao porteiro que havia identificado o problema e que logo voltaria com uma equipe para resolver.
Conversa fiada: não veio equipe alguma – e, por volta de 10 horas, duas viaturas da Enel ficaram no Cemucam, resolvendo o problema do parque. Pessoas da diretoria do bolsão foram até lá, conversaram com os motoristas, que, daí sim, lá pelas 12:30 passaram pelas ruas do bolsão, fizeram algum conserto (rapidíssimo, por sinal) e afirmaram que teriam que arruma “a rua de cima” para religação, mas que seria rápido.
Contudo o conceito de tempo da Enel é de alguma realidade paralela. “Rápido”, no caso, demorou três horas. Por volta de 14 horas o pessoal do condomínio foi conversar com os operadores, que estavam (dois caminhões) parados, esperando a ordem da central para religação.
Por vola de 14:30, 15 horas, a energia voltou, para felicidade geral da nação.
HOJE
De acordo com noticiário das redes de TV, estamos entrando hoje no terceiro dia da crise, sem luz, com muita briga política e cobranças à ENEL. O importante é que aproximadamente 700 mil residências, muitas delas em Cotia, ainda continuam sem energia (escrito às 7h58m).
A ANEEL, agência reguladora de energia elétrica, acusa a ENEL de atuar aquém do previsto em plano de contingência. Ah, verdade: a afirmação partiu de dirigentes da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Agência Reguladora de Serviços Públicos de São Paulo (Arcesp), que teimam que a Enel, concessionária de energia que atende 24 municípios, disponibilizou um número de funcionários aquém do que ela própria havia prometido para lidar com eventos dessa magnitude.
O presidente da concessionária, Guilherme Alencastre, não deu um prazo para o restabelecimento completo do serviço; até a noite de domingo, dois dias após o temporal de sexta-feira, ainda havia 698 mil imóveis sem luz na capital e na Região Metropolitana.
Segundo o jornal O Globo, a crítica de órgãos de controle ao descumprimento do plano de contingência aumenta a pressão sobre a Enel, também alvo de cobranças do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do governo federal. Em entrevista coletiva após a reunião, o diretor da Arcesp, Thiago Veloso, afirmou que a Enel havia se comprometido a empregar 2,5 mil pessoas em “cenário de contingência extrema”, como o desta semana. O plano havia sido apresentado após outro apagão, em 2023.
— Esse número ainda não foi alcançado. Nós temos hoje de 1,7 mil a 1,8 mil pessoas. (…) Nos preocupa a capacidade de mobilização neste momento e a velocidade desse restabelecimento do serviço em São Paulo — disse Veloso.
O diretor da agência afirmou ainda que o restabelecimento do serviço por parte da Enel está mais lento do que em outro apagão causado por temporais, no fim de 2023. A concessionária informou que só atingirá nesta segunda-feira o patamar de 2,5 mil trabalhadores, três dias após o apagão.
Na véspera, o governador Tarcísio de Freitas havia cobrado o Ministério de Minas Energia e a Aneel para abrir “imediatamente” o processo de caducidade do contrato da Enel. Neste domingo, o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, afirma que está avaliando a evolução da reação da Enel ao evento, e que o processo vai tomar o tempo necessário para que a empresa seja punida, se for o caso de fazê-lo.
Além do apagão, o temporal com forte ventania em São Paulo deixou um rastro de sete mortes e de transtornos em serviços públicos e ao comércio. O impacto acabou transbordando ainda para a campanha eleitoral à prefeitura e gerou trocas de acusações.
Resta aos consumidores aguardar o bom desfecho, enquanto os dirigentes estaduais e federal não tomam providências efetivas.
Privatização é bom? Depende.
Se a privatização da SABESP seguir a linha de leniência que se está seguindo com a ENEL, resta-nos aguardar grandes crises…
(Da redação – Antonio Melo – Foto: Enel – divulgação)
Luciana conectou respirador no carro para manter aparelho da filha — Foto: Arquivo pessoal
Procurada pelo GLOBO para comentar o caso, a Enel disse que “tem priorizado o serviço a hospitais e clientes que dependem de equipamentos elétricos para sobreviver”, e acrescentou ter instalado um gerador de energia para atender a casa de Luciana.
Segundo o governo do estado, a falta de luz também afetou o abastecimento de água em São Paulo, em Cotia e em outros municípios do ABC Paulista, como Santo André e Mauá. Houve problemas no funcionamento de equipamentos que transportam a água para locais mais altos. Segundo a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), 165 semáforos seguiam fora de operação na capital até a tarde de domingo, a maioria por falta de luz.
Problemas em série
Para além do apagão, o temporal gerou outros transtornos na Grande São Paulo, como pontos de alagamento. Em Cotia, a chuva e as rajadas de vento derrubaram portas e parte da estrutura do teto de um hospital. Um shopping na Zona Sul de São Paulo foi afetado de forma semelhante, e um carro no estacionamento foi atingido por destroços.
As rajadas, segundo a medição da Defesa Civil, chegaram a 107 km/h na noite de sexta-feira e superaram o recorde anterior, do temporal de novembro de 2023, quando os ventos haviam chegado a 103 km/h. Por falta de condições climáticas, o Aeroporto de Congonhas precisou fechar a pista por cerca de 20 minutos na noite de sexta, e duas decolagens foram canceladas.
Já o Corpo de Bombeiros informou ter recebido, até a manhã de domingo, 466 chamados para ocorrências relacionadas a quedas de árvores. As sete mortes registradas desde sexta tiveram relação com desabamentos tanto de troncos e galhos quanto de um muro.
No sábado, um cachorro morreu ao pisar em um fio de alta tensão rompido no bairro Santo Amaro, na Zona Sul de São Paulo. Os tutores só conseguiram resgatar o corpo do animal no início da tarde de domingo, mais de 24 horas após o incidente. Com a intensidade da descarga elétrica, de acordo com o relato, o animal ficou preso ao fio energizado, o que impossibilitava a retirada.
Para resgatar o corpo do animal, uma das tutoras, Marina Guedes, contou ter tentado falar com a concessionária Enel “dezenas de vezes” para desativar a energia da rua. O atendimento de técnicos só ocorreu na tarde deste domingo.
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