‘RIOS VOADORES’ IMPEDEM A RECUPERAÇÃO DO GELO NO ÁRTICO
Estudos apontam que chuvas muito fortes são efeito dos chamados “rios voadores”; no Ártico, que também tem rios voadores, chuvas podem estar impedindo a recuperação do degelo, afetando o clima terrestre.
As mudanças climáticas têm afetado os sistemas de chuva em todo o mundo, com alguns eventos extremos, como secas prolongadas e precipitações intensas, acontecendo cada vez mais nos últimos anos.
Além dos estragos causados em locais densamente povoados, em plantações e em encostas de morros, as chuvas muito fortes -que podem ser efeito dos chamados “rios voadores”- afetam também os sistemas atmosféricos nos polos.
Um novo estudo aponta que essas mudanças têm afetado também a recuperação do gelo no oceano Ártico, que sofre o degelo no verão, com as temperaturas mais altas, e não consegue se recuperar no inverno, quando os rios voadores são mais frequentes.
A pesquisa foi publicada no último dia 6 de fevereiro na revista especializada Nature Climate Change (do grupo Nature) e foi liderada por cientistas da Universidade Estadual de Pensilvânia (EUA). Participaram também pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e da Universidade Columbia (NY).
Os rios voadores são transportes horizontais de massas de água no formato de vapor. Eles podem percorrer milhares de quilômetros, carregar energia para outros sistemas e provocar chuvas intensas.
Em geral, os rios voadores se formam em sistemas atmosféricos de todo o mundo nos níveis médios e altos -e podem transportar um volume de água muito elevado, semelhante ao dos rios amazônicos.
A presença de rios voadores no Ártico já era conhecida -os cientistas descreveram pela primeira vez esse fenômeno na região leste do Ártico há mais de dez anos-, mas a descrição dos efeitos deles no gelo polar só foi possível por meio da análise de imagens de satélite obtidas pela Nasa, a agência espacial americana.
Pengfei Zhang, primeiro autor do estudo e professor assistente de meteorologia e climatologia na Universidade Estadual da Pensilvânia, disse que as medições antes eram difíceis de se fazer pois, com as mudanças sazonais na superfície de gelo no mar, não era possível colocar um aparelho para mensurar a perda de área de gelo.
O estudo então analisou a frequência de rios voadores nos últimos 40 anos (de 1979 a 2021) na região oceânica do Ártico (ou seja, as calotas de gelo e geleiras polares, e não o continente ártico) e comparou a relação de água (mar) e gelo em duas estações: no verão (de junho a agosto) e inverno (novembro a janeiro).
Embora as temperaturas na região sejam permanentemente baixas, no verão elas alcançam a marca positiva, enquanto no inverno chegam a zero ou menos -quando ocorre o ponto de congelamento.
Assim, a proporção é de maior degelo no verão, com recuperação de parte da cobertura congelada no inverno. Só que, nos últimos 20 anos, a proporção ficou negativa, indicando que há mais perda de água do que recuperação do gelo.
“No inverno é esperado que o gelo se recupere, mas assim que houve um leve crescimento da área de gelo, a chegada de outro rio voador fazia com que esse crescimento fosse interrompida, e foi assim até a proporção de água se expandir para toda a região sul do mar Ártico nos últimos anos”, explica Zhang.
“A temperatura do Ártico no verão sempre será acima da temperatura de congelamento, e no inverno abaixo de zero, mas o que observamos é que ela está muito mais quente agora do que há 40 anos”, completa.
De acordo com o pesquisador, há também uma mudança com efeitos diretos na possibilidade de absorção da energia solar. “A água no mar aberto ártico é mais escura, com maior absorção de energia solar, enquanto a água que está presa no gelo reflete a luz. Assim, quanto maior a concentração de água no mar devido ao degelo e menor aquela contida nas geleiras, mais energia solar será absorvida na primavera e verão”, diz.
Outro ponto investigado pelo estudo foi se essa diferença na proporção de mar e gelo era consequência direta de ação humana (o aquecimento global) ou de fenômenos naturais dos sistemas atmosféricos.
“Geramos modelos matemáticos para estimar se a frequência dos rios atmosféricos era causada por fatores intrínsecos [como as correntes pacíficas] ou extrínsecos [como o aquecimento global]. Mais de dois terços [68%] eram por influência direta humana, ou seja, aquecimento global, e apenas 32% eram causados por variabilidade natural dos sistemas atmosféricos”, afirma.
Zhang ressalta ainda que os efeitos do aumento da frequência de rios voadores atingem tanto os ecossistemas naturais quanto as atividades humanas.
“De um lado, há um efeito direto na atividade humana, com o aumento de rotas de navegação no oceano Ártico [devido ao degelo]. Mas isso é um ponto específico frente aos desafios que isso traz para os ecossistemas, a começar, por exemplo, pelas populações de ursos polares, que vão ter cada vez menos área de gelo para caçar as focas”, explica.
O climatologista afirma que há apenas uma forma de frear esse crescimento: adotar medidas agressivas de mitigação do aquecimento global.
“Se não agirmos agora, essa proporção de gelo em relação ao mar que já foi perdida não será recuperada. Alguns cientistas do clima preveem que, em 20 ou 30 anos, não haverá mais gelo no verão ártico.”
(Fonte MSN/conexãoplaneta.com.br)
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