DAS GRADES PARA A NATUREZA: IRMÃOS TIGRES TÊM NOVA CHANCE
Tigres siberianos que vivem desde 2019 em zoológico de Piracicaba irão agora para o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, onde terão vida livre de grades.
O pedido de socorro partiu da própria prefeitura de Piracicaba, no interior de São Paulo. São dois tigres- siberianos (Panthera tigris) que vivem desde 2019 no zoológico da cidade e que em breve terão novo endereço: o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, a 180 km de onde vivem hoje.
“A Secretaria Municipal de Infraestrutura e Meio Ambiente de Piracicaba enviou um ofício para nós solicitando a transferência dos tigres. O zoológico é o mesmo em que vivia o urso-de-óculos Yahrann, hoje acolhido pelo Rancho”, contam Silvia e Marcos Pompeu, fundadores do santuário de vida selvagem.
Para a nova empreitada, o casal lançou a campanha “VIDA NOVA AOS IRMÃOS TIGRES”. O objetivo é arrecadar recursos suficientes para o translado dos animais e a construção de um recinto exclusivo no Rancho dos Gnomos, que fica em Joanópolis, também interior paulista, quase na divisa com Minas Gerais.
“Estivemos no zoológico para conhecer a real situação dos tigres. Eles estão num ambiente que dilacera os nossos corações… entre grades, paredes e olhares que clamam por socorro”, diz Silvia.
“Durante o dia, são gritos e falatórios dos visitantes, e à noite, o barulho dos veículos nas ruas e rodovias que cercam o zoo fica ainda mais forte”, afirma ela. “A prefeitura se mostra muito interessada em melhorar a vida dos animais”.
O acordo de transferência foi assinado no dia 24 de maio. As obras para o novo recinto já começaram. No entendimento de Silvia e Marcos, a situação é emergencial e a construção vai ser em tempo recorde.
A ideia é que até setembro eles já estejam no Rancho. “Queremos em no máximo 120 dias fazer a transferência, mas ainda trabalhamos com um prazo de mais 30 dias extras para qualquer eventualidade”, revela Silvia.
Yuri e Dara são irmãos, têm 5 anos e já nasceram em cativeiro, no zoológico de Itatiba. Vieram de lá para Piracicaba.
O que muda na vida dos irmãos tigres?
Além de recintos espaçosos e com diversos ambientes, no Rancho dos Gnomos não há visitação do púbico. A área fica afastada da cidade e é rodeada de natureza.
De início, os animais são batizados com um novo nome e costumam demonstrar rapidamente comportamentos mais saudáveis. Os ursos, por exemplo, chegam muitas vezes com comportamentos estereotipados e repetitivos como pulos e voltas em si mesmos. Após a adaptação, é comum o registro da mudança. Eles ficam mais calmos e alguns chegaram a hibernar, característica típica da vida selvagem, numa demonstração clara de redução de estresse.
Em maio de 2022, o urso-de-óculos Yahrann – antes conhecido como Juco – chegou ao Rancho também transferido do Zoológico de Piracicaba.
Marcos Pompeu lembra que jovem, com sete anos de idade, pelo pequeno espaço em que vivia, não tinha força muscular para subir e descer no recinto de 2 mil metros quadrados com direito a piscina, oca, deques, plataformas e troncos. Hoje, já completamente adaptado, é ágil, esbanja energia e não fica mais ofegante ao se locomover pela área.
EM PIRACICABA, UMA MUITA BEM-VINDA MUDANÇA DE MENTALIDADE
O município de Piracicaba passa por uma transição de conceito sobre a função dos zoológicos.
“Ter animais aqui apenas para entretenimento é contra os princípios que hoje pregamos na educação”, explica a vereadora Alessandra Bellucci. Foi ela quem levantou a bandeira de não ter mais animais exóticos nessas instituições.
Segundo ela, houve certa resistência inicial, mas quando o atual secretário de Meio Ambiente Alex Salvaia assumiu a pasta, o entendimento mudou. “Na hora, ele abraçou a ideia”, afirma Alessandra.
A partir da constatação da melhora na qualidade de vida que o urso-de-óculos conquistou com a ida para o Rancho dos Gnomos, não houve qualquer resistência da prefeitura em pensar na transferência dos tigres.
“A prefeitura aceitou que a gente tem que começar a mudar a mentalidade das pessoas. O nosso zoológico tem que servir para abrigar os nossos animais que não têm destino, ou seja, da fauna brasileira, que, infelizmente, não podem voltar para a natureza”, ressalta.
A parlamentar de Piracicaba afirma que o zoológico está em transição para abrigar apenas animais sequelados, vítimas de atropelamento, tráfico e maus-tratos, que passam por centros de triagem e não têm para onde ir.
Nesse processo de mudança, além de Yuri e Dara, já foram para santuários um avestruz e o urso que está no Rancho dos Gnomos. “Hoje para esses animais exóticos terem conforto e bem-estar nada melhor do que um santuário, eles precisam de sossego e não de público”, completa ela.
Pelo Rancho dos Gnomos, fundado desde 1991, já passaram mais de 25 mil animais. O santuário foi pioneiro no Brasil em receber grandes felinos e ursos. Atualmente, são cerca de 100 animais resgatados de violência, exploração, abandono ou condições precárias como em zoológicos e circos. São bichos que chegam com traumas, muitas vezes mutilados, e não têm a possibilidade de retornar à natureza.
Esse é o caso, por exemplo, dos cinco ursos que vivem em Joanópolis. Mas há ainda aves, bois, macacos, entre outros. Se não podem ser livres, pelo menos, todos conseguem dignidade, respeito e paz garantidos para o resto da vida.
“Tentamos resgatar a dignidade perdida deles, fazemos um trabalho de resgate físico e de restauração da paz desses animais, da alma deles que foi arrancada”, afirma Silva.
COMO AJUDAR?
A campanha “Vida Nova aos Irmãos Tigres” está o ar pelas redes sociais do Rancho dos Gnomos. Você também pode ajudar o santuário fazendo doações pelo site.
Há também uma lojinha com produtos, inclusive dos tigres, para fortalecer o projeto.
(Conexaoplaneta – Sabrina Pires – Foto: Zoológico Municipal de Piracicaba)