HISTÓRIA DE COTIA – EP 9 AS IRMANDADES DA FREGUESIA DE COTIA, DESDE O PERÍODO COLONIAL
Esta matéria também foi escrita pelo padre Daniel Balzan, minucioso historiador local quando vigário da matriz de Cotia
É um documento histórico, na medida em que dá a conhecer aos cotianos o que foram as irmandades existentes na cidade, desde o período colonial.
Vamos a ela
AS IRMANDADES DA FREGUESIA DE COTIA
Padre Daniel Balzan
“As irmandades que existiam, antigamente, na freguesia de Nossa Senhora de Monte Serrat de Cotia eram três:
- a) do Santíssimo Sacramento,
- b) de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e
- c) de Nossa Senhora da Conceição.
Umas dessas associações congregavam apenas homens. Outras reuniam, preferencialmente, negros. Outras, ainda, preferiam pessoas brancas!
A irmandade do Santíssimo Sacramento foi instituída pelo Pe. Antônio de Toledo Lara enquanto servia como vigário de 1751 a 1759. Em 1757 visitou a freguesia de Nossa Senhora de Monte Serrat de Cotia, o Pe. Antônio de Medeiros (vigário de Nossa Senhora da Candelária de Itu e visitador ordinário das vilas e freguesias do bispado de Dom Frei Antônio de Madre de Deus, 2º bispo de São Paulo). O visitador não poupou elogios ao vigário por ter tomado a iniciativa de instituir mais uma irmandade na freguesia:
Não menos se-lhe louva o zelo que tem mostrado na instituição da Irmandade do Ssmo. Sacramento, do qual todos devemos ser mais devotos, por dele nos proceder todo o bem, pois, sem dúvida era coisa muito feia e digna de se estranhar não haver a Irmandade de tão Altíssimo Senhor em uma freguesia de tão aumentado e lúcido povo como este” (Tombo de Cotia: 1728-1844, p.29v).
A tarefa da Irmandade do Santíssimo Sacramento era promover o culto à Eucaristia. Esta prática só era possível nos centros urbanos, ou seja, na Igreja Matriz da freguesia, pois, exigia a presença do padre. Os irmãos eram obrigados assistir à missa todas as quintas feiras, havendo em seguida a adoração do Santíssimo Sacramento e bênção solene. Os membros vestiam roupas vermelhas durante o culto, carregavam tochas nas procissões eucarísticas dentro e fora da igreja, como também acompanhavam o padre quando levava o viático aos gravemente enfermos.
Apenas os homens podiam ser membros desta irmandade e, segundo as Constituições de Bahia (1707), os cantores (homens) e os irmãos podiam ficar no presbitério que era separado do resto da igreja por uma pequena grade. Portanto, quem participava desta Irmandade se sentia privilegiado e altamente honrado. (cf. HOORNAERT, Eduardo et alii. História da Igreja no Brasil. Tomo 2, Vozes, Petrópolis, RJ. 1977, p.237).
Por esse tempo, já existiam na freguesia de Cotia as Irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e de Nossa Senhora da Conceição.
A finalidade da Irmandade do Rosário era difundir a devoção a Nossa Senhora através do rosário. Além do terço, os irmãos cuidavam do enfeite do altar da Santa e participavam de procissões, particularmente, daquela da festa de Nossa Senhora do Rosário no mês de outubro. Os membros desta irmandade podiam ser tanto homens quanto mulheres, geralmente, negros.
A irmandade de Nossa Senhora da Conceição congregava homens e mulheres, preferencialmente brancos. Sua finalidade era difundir a devoção a Nossa Senhora através da consagração da pessoa, da família e da paróquia à Virgem Maria.
Cada irmandade tinha o altar da santa protetora, sepulturas próprias para o enterro dos irmãos associados e seu patrimônio. Cada uma assegurava aos sócios um enterro decente. Estes, porém, eram obrigados a pagar, periodicamente, uma contribuição em dinheiro que era estabelecida pela própria irmandade ou pelas autoridades eclesiásticas.
Parece que, com o decorrer dos anos a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição foi se dividindo em duas confrarias: na dos “homens brancos” e na “dos homens pardos”. Não sabemos qual foi o motivo dessa divisão. Talvez os “pardos” queriam distanciar-se dos brancos e vice-versa a molde da sociedade da época. Na prática era impossível uma irmandade de brancos e negros!
Quando, em abril de 1776, chegou na freguesia de Cotia o bispo Dom Frei Manoel da Ressurreição, a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição dos homens pardos estava em decadência. O visitador insistiu junto ao vigário Pe. Manoel da Cruz Lima e aos irmãos da Irmandade a elegerem uma diretoria atuante e dinâmica, capaz de reanimar a devoção a Nossa Senhora.
“Com grande mágoa nossa achamos muito decadente a confraria de N. Senhora da Conceição dos homens pardos, cuja diminuta receita por se não pagarem os anuais não chega para a necessária despesa e por isso se deixam de cumprir os encargos do compromisso. Estranhamos a sua pouca devoção e recomendamos ao Rev. Pároco que incessantemente afervore a usa tibieza e faça muito para que nas suas devoções, a que se deve presidir, se elejam para a mesa, irmãos devotos, zelosos e amantes da Soberana Rainha dos Anjos e Mãe dos pecadores” (Tombo de Cotia: 1728-1844, p.55).
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Pelos anos de 1907 surge, em Cotia, um problema grave envolvendo a Irmandade de São Benedito. O vigário era Pe. Emílio Vigorita. Este foi espancado por alguns membros daquela irmandade por não permitir que os associados saíssem pelas ruas pedindo esmolas com o oratório do santo. Como conseqüência a capela de São Benedito ficou interditada durante dois anos. Vejamos como Pe. Aurélio Fraissat descreve o caso:
“A capela de São Benedito estava fechada em virtude de um interdito lançado por S. Excia. Rev. Sr. Dom Duarte Leopoldo e Silva para expiação de um crime que cometeram algumas pessoas que faziam parte da Irmandade de S. Benedito – espancaram o Vigário por Ter este querido impedir que tirassem esmolas pelas ruas com o oratório ou relicário de S. Benedito e Ter feito isto com uma certa violência demasiada. Tendo isto chegado ao conhecimento do Sr. Bispo, ele mandou que se fechasse a Capela com um interdito. Este interdito foi levantado no dia 16 de maio de 1909. Era um Domingo, depois da missa paroquial, o Pe. Bosse rezou com o povo, de joelhos, os salmos penitenciais e em seguida fez sair a procissão com a imagem de S. Benedito para a capela deste Santo; tendo chegado, fizemos a abertura da porte e entoamos o “Te Deus”, ficando assim de novo aberta a Capela de S. Benedito” (Tombo de Cotia: 1878-1912, p.31. Arquivo Metropolitano Dom Duarte Leopoldo e Silva).
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