LEI DE COTAS COMPLETA DEZ ANOS E REVISÃO É NECESSÁRIA

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Ao completar dez anos, a Lei de Cotas, publicada em 29 de agosto de 2012, determina que metade das vagas nas instituições públicas de ensino superior sejam destinadas a estudantes que fizeram todo o ensino médio em escolas públicas; universidade cita debate para novos recortes na lei. 

A Lei de Cotas foi publicada em 29 de agosto de 2012. Ela determina que metade das vagas nas instituições públicas de ensino superior sejam destinadas a estudantes que fizeram todo o Ensino Médio em escolas públicas.

Uma parte dessas vagas é ocupada exclusivamente por candidatos pretos, pardos e indígenas — como uma forma de compensação histórica. Quem explica é o diretor-executivo da Educafro Brasil, Frei Davi: “Existia uma lei em 1884 que proibia negros de frequentar escolas. Então, se hoje boa parte de nós, afro-brasileiros, estamos nos trabalhos mais humildes, onde a nossa ausência nas universidades é gritante, foi todo um planejamento de Estado.”

Na época em que estava sendo implantada no Brasil, os críticos da Lei de Cotas afirmavam que a nova regra iria piorar a qualidade das universidades do país. No entanto, essas previsões não se confirmaram.

É o que indicam estudos como o da Unesp, a Universidade Estadual Paulista, envolvendo mais de 30 mil alunos entre 2014 e 2017. A pesquisa mostrou que não há diferenças relevantes no desempenho acadêmico entre alunos cotistas e não-cotistas.

Para a presidente da União Nacional dos Estudantes, Bruna Brelaz, os últimos 10 anos mostram que a Lei de Cotas está cumprindo seu propósito social: “É um benefício que garante que aqueles que produzem ciência, que produzem pesquisa, que produzem extensão a partir da universidade sejam aqueles que representem integralmente o povo brasileiro. Não pode ser só uma parcela ínfima da população.”

Para o professor Nelson Inocêncio, do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros da Universidade de Brasília, a Lei de Cotas também tem problemas que precisam ser corrigidos — como o acesso por meio da autodeclaração: “Não é aceitável que os vestibulares, os exames, aconteçam da forma como vêm acontecendo. Um dos aspectos importantes é exigir que todo certame tenha a presença das bancas de heteroidentificação para evitar as fraudes.”

MAIS DE 60 PROJETOS SOBRE O ASSUNTO

A Universidade Federal de Alagoas quer ampliar o debate sobre o assunto, considerando que há mais de 60 projetos de lei no Congresso Nacional sobre as mais variadas nuances da lei, sem que as discussões tenham sequer iniciado.

Para a Universidade, que já pratica o sistema de reserva de cotas desde 2003,  anteriormente à Lei (que é de 2012), existe hoje um debate complexo entre os parlamentares sobre a reserva de vagas com o recorte racial e a defesa para que as cotas sejam apenas sociais. Atualmente, a lei estipula uma reserva de 50% das vagas ofertadas pelas instituições de ensino superior para alunos oriundos de escolas públicas, com divisão entre PPIs (Pretos, Pardos e Indígenas) e Não PPIs, além do recorde PCD.

De acordo com um recente levantamento feito pelo Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) em parceria com o Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa), foram identificadas 30 propostas legislativas em tramitação na Câmara dos Deputados que tratam sobre cotas nas universidades.

Dessas, 19 foram da atual legislatura, sendo que 12 são favoráveis a consolidar o programa e expandir o escopo, e 12 contrárias, defendendo a revogação das cotas ou alterando a proposta inicial. Essa dicotomia é declaradamente partidária.

Para o   professor Danilo Marques, coordenador-geral do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) da Ufal, essa dicotomia é declaradamente partidária.Na atual legislatura, existem seis propostas da direita, todas contrárias às cotas raciais, e sete da esquerda, sendo seis delas favoráveis e uma neutra”, detalhou Marques.

Segundo o professor, havia previsão da Lei ser votada esse ano, mas com o contexto das eleições é possível que só volte para a pauta no Congresso Nacional em 2023. Ele lembra que 2022 é o ano da revisão, mas não significa o fim da Lei. Para Danilo, o momento é de propor melhorias para o sistema e pensar na assistência dos estudantes cotistas. Na Ufal, o posicionamento favorável tem base nos resultados obtidos.

“As Ações Afirmativas nas universidades públicas têm como resultado a diminuição da exclusão social, da segregação racial, da concentração de renda e de tantos outros problemas sociais que possuem como uma de suas principais causas o preconceito racial”, afirmou Marques.

Autonomia e participação ativa

Enquanto não há novas definições, as instituições seguem com a autonomia de aprovar suas resoluções nos conselhos universitários e muitas se mobilizam para debater o assunto com a comunidade acadêmica. A Ufal participou de um evento nacional promovido pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), no último dia 19 de agosto, que abordou os desafios e as perspectivas para a Lei de Cotas no ensino superior.

O Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) representou a Ufal com a participação dos docentes Danilo Luiz Marques e Rosa Correia, coordenadores do Neabi no Campus A.C Simões, Regla Toujaguez, coordenadora do Neabi no Campus de Engenharias e Ciências Agrárias (Ceca), e Paulo Simões, pesquisador do Neabi no Campus Arapiraca. Os servidores Rômulo Rogério e José Jacó, que atuam nas bancas de heteroidentificacão da Ufal também estiveram presentes no seminário.

“O principal objetivo de nossa participação foi debater os dez anos da Lei e pensar a formulação de propostas para a continuidade e melhorias dessa importante Ação Afirmativa que mudou a cara da universidade brasileira, tornando-a mais democrática e plural. O grande desafio agora é melhorar as políticas de permanência dos estudantes cotistas”, disse Marques.

Em novembro, mês da Consciência Negra, a Ufal também vai levantar o assunto na instituição promovendo um seminário de avaliação das cotas. Na oportunidade, o Neabi vai apresentar os dados do Censo das Ações Afirmativas na Ufal com informações detalhadas sobre ingresso, evasão e assistência estudantil dos cotistas.

“O censo é essencial para a manutenção, a ampliação e o aperfeiçoamento das políticas de ações afirmativas de acesso ao ensino superior, bem como constitui um passo importante na perspectiva de melhores condições de vida para pessoas em situação de vulnerabilidade social, contribuindo para a redução dos baixos índices de escolarização, permitindo o desenvolvimento, local e nacional, a partir da perspectiva da inclusão social”, concluiu o professor Danilo.

(Fonte: Universidade Federal de Alagoas)