MORTALIDADE MATERNA: UM DESAFIO PARA A SAÚDE PÚBLICA MUNDIAL

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Morte materna é “a morte de mulheres durante a gestação ou dentro de um período de 42 dias após o término da gravidez, devida a qualquer causa relacionada com ou agravada pela gravidez ou por medidas tomadas em relação a ela, porém não devida a causas acidentais ou incidentais”. No Brasil, o índice ainda é grande mas há medidas para minimizar o risco.

 

Em 1994, a Organização Mundial de Saúde (OMS), na 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), definiu morte materna como “a morte de mulheres durante a gestação ou dentro de um período de 42 dias após o término da gravidez, devida a qualquer causa relacionada com ou agravada pela gravidez ou por medidas tomadas em relação a ela, porém não devida a causas acidentais ou incidentais”. 

Para os conceitos relacionados, o Manual dos Comitês de Mortes Maternas do Ministério da Saúde do Brasil estabeleceu algumas definições, detalhadas a seguir:

Morte Materna Obstétrica – decorrentes de causas obstétricas diretas e indiretas.

Morte materna obstétrica direta: é aquela que ocorre por complicações obstétricas, durante gravidez, parto ou puerpério, relacionadas a intervenções, omissões, tratamento incorreto ou a uma cadeia de eventos, resultantes de qualquer uma dessas causas.

Morte materna obstétrica indireta: é aquela resultante de doenças que existiam antes da gestação ou que se desenvolveram durante esse período, não provocadas por causas obstétricas diretas, mas agravadas pelos efeitos fisiológicos da gravidez.

No Brasil, a morte materna obstétrica direta é responsável pela manutenção da razão de mortalidade materna em níveis elevados. Diversos estudos nacionais corroboram esses resultados, além de destacar que grande parte destas mortes poderiam ser evitadas se a assistência à gestação, ao parto ou puerpério fosse adequada.

As quatro principais causas de morte materna no Brasil, entre as obstétricas diretas, são: as síndromes hipertensivas, as hemorragias, as infecções puerperais e as complicações do aborto. As causas obstétricas diretas são responsáveis por 66% das mortes maternas em nosso país.

As causas obstétricas diretas são mais evitáveis que as indiretas, pois dependem da qualidade da assistência durante o ciclo gravídico-puerperal.

HIPERTENSÃO

As síndromes hipertensivas são responsáveis por quase um quarto das mortes maternas no Brasil, o que indica problemas na qualidade da assistência ou falta de pré-natal. 

Além dos problemas ligados à qualidade da atenção à saúde, estudo realizado no Paraná sobre a mortalidade materna entre mulheres negras (pretas mais pardas), comparando-as com as de outras raças, mostrou que a hipertensão é um fator de risco de morte materna maior em mulheres pretas e em mulheres da raça amarela. 

As causas hemorrágicas estão ligadas diretamente à qualidade da assistência, na qual a oportunidade da atenção é fator decisivo. A falta de disponibilidade de sangue nos hospitais faz, por vezes, com que a assistência seja tardia e o agravo à saúde da mulher, irreversível.

ABORTO – QUARTA CAUSA DE ÓBITOS NO PAÍS

Entre as causas obstétricas diretas, o aborto é a quarta causa de óbito materno no país, o que demonstra a completa falência da assistência à população, visto que o planejamento familiar é um direito garantido na Constituição de 1988. 

A morte de mulheres por aborto indica que as ações de planejamento familiar não estão funcionando adequadamente. 

Associada a isso, existe a questão da criminalização do aborto, que contribui para agravar ainda mais o problema, ao obrigar as mulheres a realizar a interrupção da gravidez na clandestinidade, sob condições precárias de assistência.

Os principais fatores contributivos para a morte materna são a idade materna, assistência pré-natal e qualidade da assistência, existência de um sistema de referência e contrarreferência e a via de parto.

A resolução desses problemas de saúde depende da frequência e qualidade do pré-natal e da qualidade da assistência ao parto.

A qualidade da assistência ao pré-natal e ao parto depende tanto da instituição de saúde como do profissional que presta o atendimento. A instituição nem sempre está preparada para a atenção obstétrica e há casos de falta de sangue e derivados.

Finalmente, falta também um sistema de referência e contra referência, que vincule o pré-natal ao parto e regule a disponibilidade de leitos nas maternidades, o que evitaria que a mulher em trabalho de parto fosse obrigada a peregrinar e mendigar por assistência.

O tipo de parto é um dos fatores que contribuem para a morte materna. Hoje, sabe-se que o parto por cesariana expõe a mulher a um maior risco de complicações e morte.

A IMPORTÂNCIA DO PRÉ-NATAL

Uma revisão da literatura deixa clara a importância da realização de pré-natal para identificação de riscos potenciais, garantia de um suporte nutricional à gestante, tratamento de doenças e estabelecimento de programa de imunização materna, objetivando diminuir o risco obstétrico. 

A primeira visita de pré-natal é recomendada até a 12ª semana de gestação, onde deverá ser avaliado o risco obstétrico. Para que o pré natal seja considerado efetivo, a recomendação da OMS, é que sejam realizadas, no mínimo, oito consultas, por um profissional habilitado. 

No terceiro trimestre da gravidez, período risco aumentado para as complicações, há necessidade de uma vigilância mais assídua, com redução do intervalo entre as consultas, mesmo em gestações de baixo risco e independentemente das condições fetais. 

Além da ação preventiva e terapêutica, o pré-natal tem função de orientação, proporcionando medidas de suporte que diminuam a ansiedade materna durante o trabalho de parto. 

Além das questões biológicas e de assistência, é importante também considerar fatores sociais que dificultam o acesso das mulheres aos cuidados durante a gestação e o parto, destacando-se: pobreza, necessidade de grandes deslocamentos, baixa escolaridade, falta de informação, serviços inadequados, falta de acolhimento, violência obstétrica, diferentes práticas culturais, racismo e preconceito institucional. 

Humanizar o parto é um fator importante no combate à morte materna.

A humanização do parto é basicamente o respeito à individualidade das pessoas, é saber ver e escutar o outro, permitindo a adequação da assistência segundo sua cultura, crenças, valores e diversidade de opiniões das mulheres. 

É necessário encontrar novas formas para que a mulher possa ter maior controle sobre o processo do nascimento e parto; que seja respeitada enquanto cidadã, tendo o direito de escolha, por exemplo, de um acompanhante, para que possa ter suporte emocional de uma pessoa próxima com quem ela queira compartilhar esta experiência. Enfim, é necessário resgatar a subjetividade da experiência de parir, que ficou perdida depois da institucionalização do parto.

A chave da humanização do parto é o pré-natal, pois neste período pode-se se oferecer à mulher orientações adequadas para todo o processo da gestação ao puerpério, e pode-se também conscientizá-la de seus direitos. 

A mortalidade materna continua sendo uma epidemia que atinge os países em desenvolvimento e, em especial, as mulheres de classe econômica menos favorecida. Para redução destas mortes devem ser propostas medidas de prevenção, planejamento familiar abrangente, que impeça a ocorrência de gravidez indesejada, assistência pré-natal adequada, equipe qualificada para atendimento nas emergências obstétricas e vigilância no período puerperal. 

É de fundamental importância para os estudos epidemiológicos, o preenchimento adequado dos atestados de óbito, para identificar os casos de morte materna e encaminhá-los para os comitês de morte materna. Cabe a estes organismos não só a investigação dos casos, mas também a recomendação de medidas para evitar um novo óbito. 

Nesse contexto, foi desenvolvido o critério de morbidade materna grave ou “near miss materno” que é definido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como: “uma mulher que quase morreu, mas sobreviveu a uma complicação materna grave, ocorrida durante a gravidez, o parto ou em até 42 dias após o término da gravidez”.

O progresso na redução da mortalidade materna tem sido lento na maioria dos países que tem altas taxas de mortalidade materna, e as soluções para este problema global são necessárias com urgência e condutas que visam a melhorias nas condições de vida das gestantes/puérperas devem ter maior ênfase, visando minimizar os índices de morte materna, considerando não apenas como um problema de saúde de difícil resolução, mas avaliando indicadores socioeconômicos e rastreando grupos de vulnerabilidade social.

(Com conteúdo do Ministério da Saúde/ UFMG)